quinta-feira, 26 de agosto de 2010

A vã pergunta

Esta jovem pensativa, de olhos cor de mel e de longas pestanas penumbrosas
Que está sentada junto àquele jovem triste de largos ombros e rosto magro
É ela a amada dele e é ele a amada dela e é a vida a sombra trágica dos seus gestos?
Este trem veloz cheio de homens indiferentes e mulheres cansadas e crianças dormindo
Que atravessa esta paisagem desolada de árvores esparsas em montes descarnados
É ele o movimento e é ela a fuga e são eles o destino fugitivo das coisas?

Que dizem os lábios murmurantes dele aos olhos desesperados dela?
Que pronunciam os lábios desesperados dela aos olhos lacrimejantes dele?
Que pedem os olhos lacrimejantes dele à paisagem fugindo?
Não são eles apenas uma só mocidade para o tempo e um só tempo para a eternidade?
Não são seus sonhos um só impulso para o amor e os seus suspiros um só anseio para a pureza?
Por que este transtorno de faces e esta consumição de olhares como para nunca mais?
Não é um casto beijo isso que bóia aos lábios dele como um excedimento da sua alma?
Não é uma carícia isso que freme nas mãos dela como um arroubo da sua inocência?
Por que os sinos plangendo do fundo das consolações como as vozes de aviso dos faróis perdidos?
É bem o amor essa insatisfação das esperanças?
                                                            Vinícius de Moraes

Um comentário:

  1. vim aqui e encontrei um texto do vinícius que ainda não conhecia.

    brincadeira impressionante.

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